Sou absolutamente contra julgamentos sobre quem é mais ou menos palmeirense, por torcer de casa, do radinho ou do estádio. E isso que escrevo nada tem a ver com isso.
Mas tem coisas, como algumas que ocorreram no jogo de hoje, que só mesmo estando no Palestra para sentir.
Depois do jogo, fiquei imaginando quais teriam sido minhas reações a cada um dos polêmicos lances do jogaço, se eu estivesse no conforto do sofá de casa.
Teria ficado emputecido com cada um dos erros individuais, que deram de presente gols ao adversário. Indignado com erros de passe injustificáveis. Louco com cobranças de falta mal-sucedidas. Devastado com o final de um 1º tempo em que jogamos melhor, mas saímos derrotados por 2 a 0.
Todos estes teriam sido sentimentos e impressões legítimas, mas frias, que provocariam maximamente alguns xingamentos, contorções no confortável sofá, mas tudo no calor de uma sala aconchegante ou no calor humano de um bar com os amigos. E eu não teria vivido certas emoções, as quais contarei para meus filhos e netos.
Acontece que hoje, no Palestra Itália, fui presenteado com o que de mais inebriante e inexplicável só o futebol e o Palmeiras proporcionam.
Entrei no estádio com pelo menos duas horas de antecedência, para garantir o mesmo lugar de onde vi aquela épica vitória nas semifinais do Paulista, sobre o mesmo adversário. Superstição? Magina... mas não custava nada.
Logo de cara, a primeira surpresa desagradável. Enquanto as arquibancadas se enchiam, naquela maré alviverde que subia preenchendo os melhores espaços, vejo um velho colega dos tempos de colégio, com o qual perdi contato há mais de 10 anos. O fator desagradável é que este ex-companheiro sempre foi sãopaulino. E dos mais típicos.
Quando o vi, num primeiro momento fiquei puto, me sentindo absolutamente revoltado com tamanha ousadia. Fiquei na dúvida entre cumprimentá-lo ou ignorá-lo, entre ser irônico ou ser filho da puta.
Meu senso de civilidade e de responsabilidade me fez ficar calado, e tive que tolerar aquela presença invasora em silêncio e em segredo. Caso contrário, um ato irresposável de delação da minha parte poderia causar uma pequena tragédia.
Enfim, creio que o próprio tenha refletido algo parecido com relação à sua ousadia, e ambos fingimos que não nos vimos. Não nos cumprimentamos, desviamos o olhar contrangedoramente e ele foi sentar-se o mais distante possível dali. Mas não foi longe o suficiente.
De onde eu estava, fiquei fiscalizando o comportamento do invasor os 90 minutos. Com uma ponta de raiva com a audácia da invasão, mas com uma satisfação tremenda por enxergar em sua expressão facial uma verdadeira humilhação, a cada lance em que tinha que engolir calado suas reações ao jogo, e ainda travestir-se de algo que não era.
Como já disse anteriormente, tratava-se de um sãopaulino típico. Assim, talvez travestir-se não tenha sido tão humilhante para ele.
Ainda neste episódio do invasor, foi irritante vê-lo a todo momento tentando se esquivar da minha vigilância, talvez com receio de a qualquer segundo eu denunciá-lo. Foi hilariante vê-lo gritando "Rogééééério, viaaaado". Foi enojante ver seu sorrisinho absolutamente contido, e reservado a 0,1 mm de canto de boca, quando o 1º tempo acabou com 2 a 0 a favor de seu time.
Mas foi um verdadeiro deleite observar a mudança na sua expressão quando saiu o nosso primeiro gol. Embora o invasor estivesse cercado pela massa verde desde o início, o resultado favorável provavelmente lhe deu uma falsa sensação de conforto. Ver sumir aquele sorrisinho escondido, contendo a mais repulsiva arrogância sãopaulina. Ver a cara de atrevimento virar semblante de terror.
Do sorrisinho arrogante ao semblante de terror. Foi assim que evoluiu a expressão do invasor vigiado, quando o Palmeiras fez o primeiro. Terror, porque foi naquele momento em que ele claramente percebeu que não estava em casa. O Palestra Itália pegou fogo, inflamou-se. E o invasor se borrou.
Aquele era o termômetro do jogo. Um termômetro preciso demais, aliás. E sem a menor pretensão de profetizar, no momento da falta em que sairia o nosso segundo gol, "eu já sabia".
Da arrogância ao terror em 2 ou 3 minutos. Da euforia ao silêncio fúnebre. Isto do lado do invasor, claro.
Do nosso lado, do lado de quem manda no pedaço, dos donos da casa, da torcida que canta e vibra, e do estádio que pulsa, este foi um dos jogos mais significantes deste campeonato. Não pelo resultado, óbvio. Afinal, futebol por futebol, a vitória seria nossa por merecimento. Mas pela forma poética ou épica de escrever mais um capítulo da nossa trajetório rumo ao título.
Os 25 mil palmeirenses tiveram a alegria de ver calar-se o setor lilás do estádio, após 15 minutos de intervalo bailando em sua doce ilusão arrogante. Tive o mesmo prazer, talvez um pouco mais personalizado, em razão do invasor. O prazer de apertar o botãozinho do "LIGA" da arrogância bambi e fazê-la desmoronar em tão pouco tempo foi inenarrável.
Se tivesse assistido ao jogo de casa, eu não teria vivido nada disso. E provavelmente não teria tantos ingredientes para achar este 1 ponto e o empate tão saborosos. Especialmente saborosos por mantê-los em seu devido lugar: abaixo de nós.
Se tivesse assistido ao jogo de casa, talvez eu não tivesse valorizado tanto o esforço desses caras que honraram a camisa do Palmeiras, que conseguiram empatar um jogo "daqueles". Este jogo tinha tudo para ser um jogo "daqueles", que quando tínhamos Bonamigo, Marcelo Villar e coisas do gênero, poderíamos ficar martelando por 300 minutos, a bola bateria na trave, na linha, e não balançaria as redes inimigas nem com mais 20 de acréscimos.
Expulsões, pênalti contra, falhas individuais decisivas, terminar um tempo perdendo do 2 a 0. Todos os quesitos para deixar qualquer palmeirense bicudo e com sua veia corneta pulsando a mil.
Mas que nada. Hoje, no Palestra, pintou um cheiro no ar, e não era de gás, nem de pimenta. Era cheiro de campeão.
4 comentários:
Muito bom, muito bom!
Excelente texto Mário!
Rumo ao Penta!
Erick
Grande texto, meus parabéns!
Excelente texto.
Depois de ver tantos "comentaristas" (principalmente da "Extremamente São PauliNa") fazendo de conta que o juiz não prejudicou o Verdão, e se calando sobre as declarações cheias de ódio, mentiras e arrogância de Muriçoca depois do jogo, é um alívio ver um texto desses.
Os são paulinos no mural ficaram revoltados. Mas é gozado que não se revoltam quando um "deles" desanda a escrever insultos e a demonstrar toda a soberba. E nem quando os comentaristas lêem um dos comentários baba-ovo de são paulinos...
Eu provavelmente nao teria conseguido me conter e ficar calado...
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